A Dupla Tríade no modelo paradigmático do Saber Religioso
A imbricação do FAZER e do AGIR COMUNICATIVOS da Religião é um processo dialético, no sentido que se pode dar à interpenetração de uma teoria da significação numa teoria da ação. Topograficamente, essa dialógica pode ser figurada pela superposição dos triângulos invertidos que figuram a dupla tríade, que dá origem ao modelo paradigmático da epistemologia de síntese.
Nessa denotação, o PRINCÍPIO é o VERBO, que imprime efetividade ao entendimento, no fundamento transcendental de cada religião; enquanto o ARQUÉTIPO é o RECONHECIMENTO que se atualiza no seu objeto e que se contingencia no respectivo modo de ser.
A REVELAÇÃO não esgota a transcendência do seu próprio fundamento – qual seja, a VERDADE essencial de Deus. E a TRADIÇÃO, não se esgota na atualidade que lhe confere uma dada religião – ou seja, na REALIDADE imanente da sua codificação.
Por conseqüência, as IGREJAS mantém com a TRADIÇÃO uma relação de duas vias: buscam nela elementos para a confirmação da(s) sua(s) EPIFANIA(S) e lhe agregam conteúdos específicos, desvelando, restaurando ou inovando sobre seu conteúdo de Saber. E, assim também, o CAMINHO descortinado por uma confissão religiosa, mantém com a REVELAÇÃO uma relação dialógica: busca nela os elementos necessários para a justificação da(s) sua(s) LEI(S) e professa os conteúdos parcelares da sua VERDADE, que se encontram acessíveis no patamar estabelecido do seu grau de entendimento.
Em conclusão, tanto a VERDADE de Deus, quanto a TRADIÇÃO do Saber Religioso, têm maior amplitude que o seu conteúdo REVELADO e RECONHECIDO no seio de cada confissão religiosa. Isso que confirma, o PRINCÍPIO DA TOLERÂNCIA e a CONVERGÊNCIA NA TRADIÇÃO, como os atributos definicionais por excelência da Sophia Perennis que integra o FAZER e o AGIR COMUNICATIVOS, na dialógica do Saber Religioso.
Não significa isso, que os movimentos religiosos sejam, necessária ou efetivamente tolerantes e convergentes – afirmação que representaria uma contrafactualidade da sua história conhecida. Significa, entretanto, que tanto quanto ou enquanto deixam de sê-lo, engessam a Verdade de Deus Revelada, empobrecem a Tradição Reconhecida do Saber Religioso e se distanciam do que se possa conceber, em termos humanos e históricos, como o modelo ideal, necessariamente performativo e incompleto, de uma Religião Verdadeira.
A restauração da dignidade dos Saberes, que se postula na epistemologia de Síntese, implica no reconhecimento de que existem fundamentos comuns a todas as divisões regionais do conhecimento - RELIGIÃO, CIÊNCIA, FILOSOFIA e ARTE. Divisões essas, que se estabelecem por mera conveniência do acesso à Planície de Alétheia, onde reside o conhecimento Uno na sua Divina Essência.
Nem a REVELAÇÃO, por conseguinte, é um privilégio do Saber Religioso, nem o Saber Religioso, por mais totalizante, e completo que o seja, abarca a totalidade do Conhecimento Humano, partícipe por inteiro, e em todos os seus aspectos parcelares, no mistério do Saber Revelado. Por isso que, RELIGIÃO, CIÊNCIA, FILOSOFIA e ARTE, no prospecto de uma epistemologia de síntese, se intercomunicam e se cobram mutuamente as respectivas aporias e os respectivos critérios de decisão.
E, por conseqüência, também, a possibilidade de chegar-se, pela via da articulação e integração de todos os domínios do conhecimento, aos axiomas fundamentais que sustentam todas e cada uma das suas divisões estruturais – ou seja, a realidade a ser alcançada como a Sintese Unificada de todo o Saber – não pode construir-se pelo imperialismo regional do Saber Religioso. E, muito menos, pela imposição sectária de uma única, completa, inquestionável e, portanto, absoluta VERDADE REVELADA na esteira da Tradição de Todos os Saberes.
Essa tarefa missionária e iluminada cobra, de cada um dos seus pretendentes, uma capacidade de intelecção para além do dogma – ou seja, para além dos paradigmas estabelecidos – em qualquer dos domínios do conhecimento. Essa dimensão do conhecimento intelectual que SCHUON denomina metafísica, remete ao fundamento epistemológico, segundo o qual, o Espírito Humano, ideado por Deus à Sua imagem e semelhança”, corresponde – no setenário dos seus três aspectos significantes e dos seus quatro aspectos estruturantes – às Faculdades Espirituais do seu Divino Arquiteto.
Cobra-lhes, também, o reconhecimento necessário de que, para os desígnios do Princípio Espiritual Uno e da sua intelecção pelo homem questionador, não existe diferença de Época, de Raça, de País, de Cultura, de qualquer sorte de idiosincrasia pessoal, grupal ou institucional, que justifique a priori ou por definição o privilegiamento do acesso à VERDADE. E muito menos a sua prosélita ostentação por este ou aquele movimento filosófico ou artístico, científico ou religioso.
Pois, sendo a VERDADE condicionada pelas condições performativas da consciência de cada um, as confissões religiosas – embora respeitáveis e desejáveis na sua própria diversidade – tanto quanto e enquanto pretendam oferecer e apropriar-se de uma resposta definitiva e última ao mistério do SER e do ABSOLUTO, tão somente a parcializam e velam. Por outro lado, a convicção religiosa do homem questionador, que humildemente exercita as faculdades indivisíveis da sua razão e sentimento, e as exacerba, até mesmo pela consciência dos seus limites, na fundamentação transcendental do saber religioso, a integra e unifica.
A Religio Vera que se atualiza pela convergência destes fundamentos, não é uma profissão religiosa excludente de todas as demais. E, muito menos, um atributo que se possa reconhecer em todas as religiões, pelo tão só respeito à sua dignidade formal intrínseca. Trata-se, com efeito, de uma qualidade adjetiva, que não se afirma pela mera postulação do respectivo rótulo por um movimento religioso, nem pela idiosincrasia das suas verdades reveladas ou do seu conteúdo de tradição reconhecida - mas, que se reserva às religiões e/ou aos religiosos que os professam, de tal maneira que não se lhes possa confrontar a violação dos pressupostos epistêmicos do Saber Religioso.
[Este texto é parte de um estudo mais amplo sobre a epistemologia da religião: "RELIGIO VERA: ELUCIDAÇÕES SOBRE A EPISTEMOLOGIA DO SABER RELIGIOSO" cujo inteiro teor e respectivas referências estão disponibilizados no disco virtual SKYDRIVE, no seguinte endereço:
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